O diretor da Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Católica Portuguesa (UCP) destaca, em entrevista à Agência ECCLESIA, que o jornalismo e os meios de comunicação “desempenham um grande papel” na construção da memória, no âmbito da Revolução do 25 de Abril de 1974.
“O jornalismo, e os meios de comunicação de uma forma mais geral, não só o jornalismo e os jornalistas, têm um papel muito importante na construção e na reconstrução da nossa memória coletiva, e, aliás, o acontecimento do 25 de Abril será um exemplo. Diria que a maioria da sociedade portuguesa, basta ter menos de 55 anos, não terá memória dos acontecimentos do 25 de Abril, mas, na verdade, todos temos memórias”, referiu Nélson Ribeiro, em entrevista à Agência ECCLESIA.
O docente destaca o papel dos jornalistas e acentua a “importância e consciência deste papel que estão a ter, ou seja, eles não estão apenas a relatar o presente, mas ao relatarem o presente também estão a ajudar a fixar aquilo que vão ser as memórias que nós vamos ficar em relação ao passado, e isso é muito importante”.
O diretor da Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Católica Portuguesa assinala que há 50 anos vivia-se um período de censura que “era muita limitadora da comunicação que as pessoas podiam ter acesso”, o que contrasta com a atualidade, em que “a informação está presente em todo lado”.
“Temos acesso a tudo, não deixa de ser também, ou de haver aqui também alguma ilusão para a qual eu julgo que é importante nós alertarmos cada vez mais, sobretudo num momento em que nós temos muitas vezes acesso e estamos a consumir a informação que nos chega, sobretudo através das redes sociais. E não nos podemos esquecer que as redes sociais têm a operar algoritmos cada vez mais poderosos que estão a selecionar a informação por nós”, adverte.
“O jornalismo tem, de facto, esse papel central de nos confrontar com visões do mundo, visões da realidade, que são diversas e que estão em discussão permanente, e nós ao fugirmos para as redes sociais, para não sermos confrontados com essa pluralidade de opiniões, obviamente isso contribui muito para uma certa polarização, que é aquilo que nós também vemos que está a acontecer em muitos países, e em Portugal também”, comenta.
Em entrevista, o professor Nélson Ribeiro salienta ainda o papel que a Rádio Renascença teve na Revolução de Abril, “que acabou por ser central a vários níveis”.
“Transmitiu aquela que foi a última senha para o 25 de Abril, que era uma senha, aliás, bastante complexa, que incluía alguns poemas, algumas mensagens, mas onde estava aquilo que ficou mais conhecido, porque lá está, é o que ficou retido na memória, a transmissão da Grândola Vila Morena”, recorda, referindo que isso só foi possível porque a rádio “na fase final do regime, tinha, de facto, contacto com muitos setores, na altura chamados progressistas, que já não se reviam propriamente naquilo que era o regime político do Estado Novo”.
“No pós-data de 25 de Abril, a Renascença acabaria também por ser uma espécie de símbolo daquilo que foi um debate e uma luta que se travou na sociedade portuguesa entre as forças que pretendiam a instauração de um regime democrático em Portugal, versus as forças de extrema-esquerda que pretendiam que Portugal se transformasse num regime mais na orla da União Soviética”, lembra.