Sem poesia, Prémio internacional

“Quem escreve um livro cria um castelo, quem o lê mora nele.” Monteiro Lobato

O mês de janeiro foi um mês de calmaria, para alguns de ressaca financeira, provocada pelas aquisições moralmente necessárias e obrigatórias do Natal. Fevereiro entrou em 2024 a brilhar de esperança e já a apontar para as celebrações que em breve choverão por aí. Falo, como é evidente, dos 50 anos do 25 de abril. Escolas, associações, autarquias, enfim, o país inteiro já fala sobre a melhor forma de mostrar que tem memória. Concordo inteiramente. É necessário, como professora e como cidadã, revelar aos jovens o que aconteceu e como aconteceu e, sobretudo, reforçar a ideia de que não se tratou de um jogo virtual, tão amado por todos, nem de uma história inventada pelos mais velhos para passar o tempo. Porém, não é sobre o 25 de abril que pretendo falar, lá chegará o seu tempo. Acabei de pesquisar sobre as individualidades nascidas neste mês que é o segundo do calendário gregoriano e cujo nome teria sido inspirado em Fébruo, deus da morte e da purificação na mitologia etrusca. Acrescente-se que fevereiro era o último mês no calendário romano extinto em 46 a. C; o calendário gregoriano é utilizado pela maioria dos países e foi promulgado pelo Papa Gregório XIII a 24 de fevereiro de 1582. Como dizia, pesquisando sobre os nascidos neste mês (e diga-se que esta janela é extraordinária, já o defendi várias vezes), encontrei cantores, atores, futebolistas, mas muito poucos escritores. Não é de estranhar, claro.

Por essa razão resolvi retirar da tumba do esquecimento um autor que nasceu em fevereiro de 1799 e que não foi apenas escritor, foi um homem de ação, foi exilado político, lutou pela causa liberal, que o dicionário advoga como sinónimo de democrático, aplicado que fosse aos tempos de hoje. O seu nome é Almeida Garrett e figura ao lado dos escritores mais importantes do nosso país; toda a sua vida foi dedicada a demolir a falácia da inutilidade do escritor. Não é profissão, como dizia Fernando Pessoa, é vocação, no entanto, embora os paradigmas sociais, políticos, financeiros e outros não o queiram admitir, o escritor é, na verdade, o trampolim para a mudança e para a inovação. Demore o tempo que demorar. E as palavras têm muito poder. Esta deixa conecta-me oportunamente com a segunda parte do meu editorial e ainda relacionada com este mês. Celebrou-se no dia 14 o Dia dos Namorados. Para que todos saibam, conta-se que, por alturas do século III, o imperador Cláudio II, querendo formar um poderoso exército romano, decidiu proibir temporariamente a celebração de casamentos para garantir que os jovens se concentrassem mais facilmente na guerra e na vida militar. Contudo, o bispo Valentim contrariou as ordens e continuou a celebrar casamentos na clandestinidade. A afronta à vontade do imperador levou a que Valentim acabasse preso e condenado à morte.

Até à sua execução, foi recebendo flores e bilhetes enviados por anónimos como demonstração de apoio e consideração pela sua conduta. A filha do carcereiro de Valentim, que era cega, movida pela curiosidade, terá pedido para o visitar no cárcere e, mal se aproximou dele, recuperou a visão. Ambos se apaixonaram um pelo outro. Numa carta escrita à sua amada, o bispo ter-se-á despedido com a expressão “do seu Valentim”, que ainda é usada na língua inglesa (“Valentine”) para designar namorado. A ordem de execução dada por Cláudio foi cumprida e Valentim acabaria por ser decapitado num 14 de fevereiro de finais dos anos 200 (séc. III). Assim, o Dia de São Valentim, Dia dos Namorados, festeja-se a 14 de fevereiro, em todo o mundo.

Ligar Almeida Garrett ao Dia dos Namorados só terá sentido se conhecerem alguns dos seus poemas. Aos 50 anos apaixonou-se pela Condessa da Luz e escreveu belíssimos poemas de amor, extremamente ousados para a época, que compilou no livro Folhas Caídas.