“Uma escola é um templo de Deus, e o mais belo de todos.” Agostinho da Silva

Tempos apressados, estes nossos tempos. Queremos tudo para ontem, gostamos de resolver tudo num abrir e fechar de olhos, com uma perna às costas, porque o novo e o diferente nos batem à porta a qualquer momento e não queremos perder nada. Queremos, numa só palavra, sentir-nos atualizados. Refira-se apenas, a título de exemplo, a pandemia e a guerra na Ucrânia: depois do pavor inicial, do pasmo inicial, falar de doentes, de vítimas ou de conquistas tornou-se quase redundante, embora saibamos que tanto uma como outra continuam bem mais perto do que pensamos. Cansamo-nos, como dizia, rapidamente das mesmas notícias, ansiamos pelo novo.

Este introito vem a propósito das recentes manifestações dos professores. Depois do impacto primeiro, relatado exaustivamente pelos media, e dos juízos apressados, com notória falta de conhecimento das verdadeiras realidades, e de alguma crueldade velada (o desgosto eventualmente provocado por um professor é muitas vezes pretexto para todos serem catalogados da mesma maneira), já ninguém se preocupa com eles. Porém, o bom senso e a experiência obrigam-me a dizer que nada está resolvido (perder uma batalha não significa perder a guerra), apesar de eles continuarem a trabalhar mesmo ao fim de semana, a preparar aulas, a corrigir testes, a preencher tabelas infindáveis, porque os dias da semana não têm horas suficientes. A maioria das pessoas deve achar que os professores são uma classe à parte, com privilégios e poderes desconhecidos. Mas, além dos alunos, têm filhos, parceiros, pais e família. E muitas vezes, longos quilómetros os separam do local de trabalho, acompanhados pela loucura de todas as manhãs e pela luta contra o sono e contra o tempo. Ao longo da minha vida profissional sempre tive por Sebastião da Gama um carinho muito especial; foi professor e poeta (morreu com 28 anos em 1952) e diz ele que para se ser professor é preciso ter as mãos purificadas, a todo o momento temos de tocar em flores. Nunca estive tanto de acordo. Os professores, de facto, regam-nas, colocam-nas ao sol, retiram-nas da chuva e do frio, quando necessário, acarinham-nas, ajudam-nas a transformar-se em árvores, base de uma estrutura social saudável. É uma longa metáfora, como já perceberam.

Ainda por falar em manifestações, falarei brevemente na que levou milhares de pessoas a Lisboa em defesa dos animais. Sem ferir suscetibilidades e não querendo magoar ninguém (até porque eu adoro animais, no lugar onde vivo convivo facilmente com cães, gatos, sapos, cobras, aves e todo o tipo de insetos), mas não acham que esta questão foi menos problematizada e muito mais fácil de solucionar?

Os animais fazem parte da família, diz-se. Concordo. E os professores que acompanham os nossos filhos durante anos e anos não o são também?

Os animais protegem-nos, diz-se. Concordo. E os professores não são porto de abrigo do conforto e da educação dos nossos rebentos, enquanto suportamos a nossa sobrevivência?

Os animais têm direito a ser respeitados, não devem ser maltratados, diz-se. Concordo. E os professores não? Podem ser censurados e confrontados pelos familiares, quando levantam um pouco mais a voz com o objetivo de dar voz à razão e à educação?

Os grandes juízes defensores dos animais são os homens. Concordo, porque considero que eles também têm alma, embora num nível diferente de evolução. E onde estão os advogados de defesa dos professores, numa sociedade onde estes continuam a competir herculeamente contra múltiplas ofertas bem mais atrativas e apetecíveis para os alunos?

Agostinho da Silva diz que “uma escola é um templo de Deus, e o mais belo de todos.” Por que razão continuamos todos a admitir que não é do nosso interesse esta questão? Talvez porque seja mais fácil fazer ouvidos de mercador e deixar que sejam os outros a resolver.

Se estou a escrever este editorial, devo o meu amor pela escrita aos meus professores. E se o leitor está a lê-lo, é porque houve pelo menos um professor na sua vida que o ajudou a desbravar o caminho, a ser pessoa mais completa.

Hoje, felizmente, podemos dizer que há um professor na vida de cada um de nós.