Em memória
(dedicado ao Padre Mário Pais de Oliveira)
Não ouviu a minha voz, querido amigo,
Pedi-lhe para não se despedir
Que precisava de si
Que o mundo precisava de si
Mas alguém o esperava já e o chamava
E lhe pediu a mão.
E lhe deu a mão
Para caminhar outras veredas bem mais belas do que as que percorreu neste mundo.
Tentaram cortar-lhe as pernas
Tentaram colar-lhe os pés à lama da indiferença.
Mas
Nunca puderam prender-lhe os braços.
Nunca puderam calar-lhe a voz.
Pedi-lhe para não se despedir já, meu amigo,
Pilar, raiz, fonte, brisa.
Guia, guarida, luz.
Olho o horizonte e é impossível não ficar triste
Pela consciência da sua ausência.
A morte é uma mentira
Não existe
Porque a sua imagem continua de pé, inteira, ao lado das palavras e dos afetos.
Olho os montes e é impossível não sorrir,
As suas gargalhadas estão presentes
No canto suave desta avezinha que me espreita na árvore vizinha,
O carinho sempre pronto estendeu-se já ao Universo
E pintou de vermelho as nuvens de fim de tarde.
Vou contar-lhe um segredo,
Conhece bem as minhas loucuras.
No momento em que resolveu partir
“tornar-se definitivamente vivente na Fonte-e-no Mar da Vida,
tornar-se para sempre invisível aos olhos de toda a gente”, como disse
Transplantava eu uma figueira para um lugar mais amplo, mais aberto para o Sol.
Afinal, o homem é, meu amigo, como a pequena figueira
Que será transplantado para outra dimensão
Mais ampla, mais livre, mais aberta para o sol.
Por tudo isto não posso ficar triste
Quando tiver saudades
Procuro-o no azul do horizonte,
No trino doce da pequena avezinha
Na pequena figueira plantada, agora mais livre.
Até sempre, querido amigo.
Cidália Fernandes