Palavras sem obras

“O país não precisa de quem diga o que está errado; precisa de quem saiba o que está certo.” – Agustina Bessa-Luís

Ano novo vida nova. Eleições novas, política nova. Será? Depois da estrondosa vitória do Partido Socialista nas recentes eleições, o país aguarda, não pelo regresso de D. Sebastião, figura histórica transformada em mito num tempo em que se acreditava na vinda de um salvador e na criação épica de um reino ideal, mas por uma espécie de recompensa, dada a confiança revelada. Segundo Aristóteles, filósofo grego que viveu no século IV a.C., o homem é um ser político e está na sua natureza viver em sociedade, significando isto que ninguém poderia, nem pode, atingir a felicidade sozinho. Este pensamento já percorreu séculos e tem certamente feito jus à atitude de muitos homens; porém, outros há que se esquecem do dever da civilidade e quando sobem um degrau na escala da popularidade e das responsabilidades sociais, esquecem-se da dignidade da função. Recordo a este respeito um clássico da literatura, tão esquecido pela ingratidão nacional: Camilo Castelo Branco, que na sua obra A Queda de um Anjo, relata a história de um político que foi para Lisboa e, seduzido pelo poder, esqueceu-se completamente das suas origens, abdicando dos seus princípios. A fazer companhia aos resultados, temos o fantasma das abstenções, que é uma força política, digamos assim, difícil de combater e que continua a ensombrar este ato social, veículo determinante dos desígnios de um país. Haverá, então, mais do que uma razão para questionar: Quem são essas pessoas que se abstêm, que se anulam, que aparentemente vivem à parte, que não têm opinião ou que revelam o seu descontentamento e o seu desencanto renunciando a um direito, pelo qual tanto lutaram os nossos antepassados? O partido vencedor tem muito trabalho pela frente, muitos desafios para enfrentar, muito diálogo para travar. Mas o maior de todos seria, na verdade, auscultar a razão do já referido absentismo. Falava há pouco com uns amigos sobre cultura política extensível à comunidade escolar. Será que os nossos jovens estão preparados para escolher com consciência as pessoas que tomarão durante os próximos anos as rédeas do país? Não creio. O argumento mais certo é, obviamente, a desmesurada obsessão e dependência das redes sociais. Será apenas isso? Há muito que defendo que os programas escolares estão desligados da realidade social na qual os jovens estão inseridos. A escola ainda é veículo de conhecimento e aprendizagem. Não seria a altura de repensar com maturidade e sabedoria na importância da integração de uma disciplina no currículo do secundário, que formasse e informasse os jovens no sentido de se tornarem cidadãos mais ativos? Recordo que a disciplina de Introdução à Política fazia parte dos programas do secundário, há alguns anos. Quem sabe se não foi ela o trampolim inspirador de muitos dos políticos da atualidade? Esta é apenas uma sugestão que pode servir de reflexão. Talvez possa ser este tema motivo para discussão nos círculos políticos recentemente eleitos.

Falemos agora de outra política, a cultural. Ao longo deste ano celebramos o centenário do nascimento de José Saramago, de Agustina Bessa-Luís e de José Craveirinha (moçambicano e Prémio Camões). Prometemos falar proximamente sobre eles, dando a conhecer um pouco mais sobre a sua obra, a sua vida a sua sabedoria. Como dizia Saramago, “não é preciso ser árvore, para se deixar raízes”.