Escrever exige ponderação e antecipação. Porque estamos em junho, gostaria de recordar a morte do grande Camões que aconteceu há 440 anos (10 de junho de 1580), e o facto de a História estar a reparar, felizmente, a ingratidão de que foi alvo no tempo em que viveu, homenageando-o com O Dia de Portugal; gostaria de recordar também o nascimento de outro mestre da literatura nacional e internacional, Fernando Pessoa (13 de junho de 1888), e por muito que dissesse muito ficaria ainda por dizer, pois foi o criador de múltiplas individualidades (deu vida a mais de uma centena de heterónimos); ou gostaria – e este é um dos meus temas mais queridos – de falar sobre o dia Mundial da Criança que se festejou no dia 1 de junho e de como é gratificante poder dialogar, através das histórias, com um público tão singular e genuíno, poder conduzi-lo para o mundo da magia, onde palavras como escravização, racismo, ingratidão, injustiça, guerra, podem ser facilmente banidas apenas porque não fazem parte da sua essência; porém, os acontecimentos precipitaram-se e como ultimamente temos assistido à vandalização ou vendalização (fenómeno de tapar com venda, arrisco o neologismo) de direitos inalienáveis, considerei que era oportuno reproduzir aqui os primeiros 5 artigos da Carta dos Direitos Humanos. Mais do que as palavras, são os atos que dignificam a Humanidade. Como dizia Padre António Vieira, no seu Sermão da Sexagésima “Palavras sem obras são tiros sem balas: atroam mas não ferem”.
“Palavras sem obras são tiros sem balas: atroam mas não ferem”, Padre António Vieira
Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo;
Considerando que o desconhecimento e o desprezo dos direitos do homem conduziram a atos de barbárie que revoltam a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os seres humanos sejam livres de falar e de crer, libertos do terror e da miséria, foi proclamado como a mais alta inspiração do homem;
Considerando que é essencial a proteção dos direitos do homem através de um regime de direito, para que o homem não seja compelido, em supremo recurso, à revolta contra a tirania e a opressão;
Considerando que é essencial encorajar o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações;
Considerando que, na Carta, os povos das Nações Unidas proclamam, de novo, a sua fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor da pessoa humana, na igualdade de direitos dos homens e das mulheres e se declararam resolvidos a favorecer o progresso social e a instaurar melhores condições de vida dentro de uma liberdade mais ampla;
Considerando que os Estados membros se comprometeram a promover, em cooperação com a Organização das Nações Unidas, o respeito universal e efetivo dos direitos do homem e das liberdades fundamentais;
Considerando que uma conceção comum destes direitos e liberdades é da mais alta importância para dar plena satisfação a tal compromisso:
A Assembleia Geral
Proclama a presente Declaração Universal dos Direitos do Homem como ideal comum a atingir por todos os povos e todas as nações, a fim de que todos os indivíduos e todos os órgãos da sociedade, tendo-a constantemente no espírito, se esforcem, pelo ensino e pela educação, por desenvolver o respeito desses direitos e liberdades e por promover, por medidas progressivas de ordem nacional e internacional, o seu reconhecimento e a sua aplicação universais e efetivos tanto entre as populações dos próprios Estados membros como entre as dos territórios colocados sob a sua jurisdição.
Artigo 1.º
Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.
Artigo 2.º
Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação. Além disso, não será feita nenhuma distinção fundada no estatuto político, jurídico ou internacional do país ou do território da naturalidade da pessoa, seja esse país ou território independente, sob tutela, autónomo ou sujeito a alguma limitação de soberania.
Artigo 3.ºTodo o indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.
Artigo 4.ºNinguém será mantido em escravatura ou em servidão; a escravatura e o trato dos escravos, sob todas as formas, são proibidos.
Artigo 5.º Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.
(…)
Será que basta derrubar uma estátua para destruir um paradigma, um preconceito?
Uma estátua demora dias a construir; um preconceito persiste durante séculos; o processo de mudança deve ter início na consciência de cada um.
É a consciência e não a inteligência que nos torna humanos.